30
Set 11
publicado por Nuno Amado, às 10:44link do post | comentar

Para muitos dos portugueses entre os 25 e os 40, o verão não é só a altura da praia e dos banhos no mar, é também a época dos casamentos. O amigo de infância, a colega de escritório ou o irmão da namorada decidem dar o nó e inicia-se um longo, por vezes penoso, processo que envolve centenas de pessoas. No centro de tudo isto está a noiva, o noivo e respectivas famílias. Sobre os tumultos psicológicos que estes sofrem já muito foi dito e escrito. Contudo, parece-me existir pouca preocupação com as tormentas dos convidados. Venho com esta crónica, e a do próximo mês, tentar preencher essa lacuna.

 

Começo pelo momento em que o convite é recebido. Alguns convidados vão sentir-se felizes por participarem naquele momento importante da vida de quem lhes é querido, ao passo que outros vão pensar angustiados “que seca monumental!”. Passado algum tempo chega outro momento importante: o da contribuição. Através da deslocação a uma loja com listas de casamento, de uma transferência bancária ou da entrega de um envelope, o convidado procura utilizar o seu dinheiro para impedir que o novo casal viva sem uma Jarra Vista Alegre ou tenha que abdicar de pequeno-almoço no Bungalow durante a lua de mel. E ninguém quer que isto aconteça!

 

O período dos preparativos é onde as diferenças entre os géneros são notórias. As senhoras vêem um casamento como uma actriz de Hollywood vê a cerimónia de Óscares. Há que eleger um vestido, sapatos, carteira, brincos e outros adereços com a dificuldade acrescida de que todas estas opções têm de estar em harmonia. Os senhores têm apenas de escolher uma gravata e, alguns, uns botões de punho. Chegado o dia da Boda enquanto os homens dormem, já as mulheres se dirigem para os cabeleireiros, onde lhes serão feitos novos penteados que as obrigarão a passar o resto do dia muito direitas com medo de os desfazer.

 

Antes da cerimónia na Igreja ou no Registo Civil, pois há cada vez mais casamentos não religiosos realizados em Portugal, dá-se a caminhada das cegonhas. Este espectáculo é proporcionado por uma série de mulheres que optaram por sapatos de salto incrivelmente alto. Os muitos metros que têm de percorrer dos seus carros até ao local onde decorre a cerimónia são feitos com pernas bamboleantes, olhares preocupados, sentimentos de vertigem e expressões de pânico. Umas poucas conseguem fazem-no com um sorriso, mas a maior parte assemelha-se a gatos bêbados sobre andas. Algumas sofrem mesmo o infortúnio de ficarem presas pelo caminho, com o salto enfiado no intervalo de duas pedras da calçada. As mais felizardas recorrem ao acompanhante a quem se seguram como um náufrago a um pedaço de madeira flutuante.

 

Salto a parte da cerimónia que é sempre feita de palavras bonitas, música comovente e estômagos ansiosos pelo copo de água. Segue-se a saída da cerimónia, o momento onde a tragédia pode ocorrer. Ocasionalmente, quando os planetas se alinham de certa forma e as forças maléficas se sentem mais livres para actuar entre os homens, uma das convidadas, ao sair da Igreja, levanta os olhos para a pequena multidão e nota, com o horror de quem encontra um assassino dentro de casa, que outra das convidadas está a usar um vestido igual ao seu. O terror que este momento pode gerar é difícil de compreender por parte dos homens, e nem toda a minha empatia me chega para compreender a total amplitude desta catástrofe. Felizmente é coisa rara, mas dizem-me que as mulheres que a experimentam ficam profundamente traumatizadas, obrigadas a reviver em pesadelos esse momento vezes e vezes sem conta. Imagino-as a acordar a meio da noite, cobertas de suor, murmurando entre lágrimas “o vestido! o vestido..é igual ao meu!”.

 

Terminada a cerimónia e a segunda caminhada das cegonhas, em muitos casamentos é requerida uma deslocação automóvel para o copo de água. A minha experiência diz-me que os noivos procuram sempre que estes locais não sejam facilmente identificáveis, nem que o percurso até eles seja simples. Suponho que para aumentar a expectativa, transformar a coisa numa caça ao tesouro. Mesmo na era dos GPS é raro que todas as pessoas cheguem ao copo de água de forma rápida e eficaz. Um truque comum é seguir o carro de alguém que pareça saber o caminho, o que transforma alguns casamentos em perseguições dignas de um rally. Infelizmente, não é incomum que um convidado inicie a perseguição de um automóvel para descobrir, tarde demais, que o outro carro não tem nada a ver com o casamento.

 

(A continuar)


19
Set 11
publicado por Nuno Amado, às 15:12link do post | comentar | ver comentários (5)

Mais tarde ou mais cedo, na vida da maior parte dos homens, chegará o momento em que uma mulher olhará para eles e, segurando dois diferentes pares de sapatos nas mãos, lhes perguntará de qual gostam mais. A pergunta parece inocente. À superfície a única coisa que é preciso fazer será apontar para o par se sapatos A ou para o B, consoante a preferência. Contudo, pobre coitado daquele que julgar que isto basta. Primeiro, indicar simplesmente de que sapatos se gosta mais sem referir os outros é um erro tremendo. Sendo o género feminino muito mais empático que o masculino, a mulher sentirá pena dos sapatos não escolhidos e ficará de imediato arreliada com o homem pela sua insensibilidade face aquele excelente exemplo de calçado. Muitos homens reagirão então precipitadamente e elogiarão o par não escolhido. Outro erro. Aí a mulher perguntará porque não foram então esses os seleccionados. O homem mostrou assim, não só ser insensível como incoerente.

 

A maior parte dos homens não está equipado para racionalizar a sua preferência por sapatos femininos. Nas poucas vezes em que de facto, preferimos o par A ao par B, é porque sim. Infelizmente, “porque sim” não é uma resposta que seja aceite por uma mulher nesse momento difícil e conturbado que é a escolha de um par de sapatos. Ela quer razões, uma justificação, uma lógica. Há uma série de truques que podem ser utilizados para tentar sair desta situação difícil. Uma opção é a sedução-e-fuga. O homem diz algo como “estás mesmo bonita hoje!” ou “Estás mais magra! Acho que nunca te vi assim!” beija a mulher e sai de cena alegando que se lembrou agora de ter deixado o carro com as janelas abertas e destravado no meio de uma rotunda. Outra opção é mentir. Se a mulher quer uma razão pois inventa-se uma. “Esse sapatos são os que gosto mais, porque vão melhor com os teus olhos.”. Para algumas mulheres tal será suficiente e poderá ser necessário avançar justificações mais consistentes. É aqui que convém aprender algum vocabulário.

 

Se os sapatos tiverem bolinhas ou traços ou manchas, podemos dizer que “gostamos mais deste padrão!”. Pode-se falar da fivela, do salto, de serem ou não abertos à frente. O truque está em encontrar uma diferença entre um par e outro par que pareça, para a mente feminina, justificar a nossa opção. Falar da cor costuma resultar, mas pode-se dar o caso de os sapatos serem da mesma coloração (em cujo caso, argumenta-se que se gosta mais do tom do par A). Ajuda também utilizar adjectivos como elegante, sofisticado, moderno, clássico, primaveril, relaxado e afins, mesmo que não percebamos de que forma se aplicam a calçado.

 

O homem sensato deve pois, quando este momento surge, responder algo como:

“Gosto dos dois. Esse par é muito bonito, mas é demasiado clássico. Este aqui é mais sofisticado e a fivela é muito gira. Além disso esse padrão está na moda e penso que esse tipo de salto te fica melhor!”

 

Se é difícil aos homens produzir uma opinião sobre sapatos de mulher, já sobre a mini-saia as justificações masculinas são imediatas: sim, sim e sim. Esta peça de vestuário é o exemplo típico de que less is more. Menos tecido, mais pernas. Como há estudos sobre tudo, também há estudos sobre a mini-saia. Parece que a altura destas está intimamente relacionada com a idade das mulheres. Quando estas começam a usar as mini-saias, aos 14 anos, ainda as usam com tamanhos modestos, 45 cms. Dos 14 para os 16 acontecem muitas coisas, e uma delas é uma diminuição do tamanho médio de mini-saia utilizado para os 35 cm. A descida continua até aos 24 anos de idade. É neste período que as mulheres utilizam as suas saias mais curtas: 31 centímetros. Nos últimos vinte anos o que sucedia então era que, a partir dos 24 o tamanho da saia ia aumentando vertiginosamente. Aos 40 anos as saias regressavam ao tamanho inicial de 45 cms, e aos 50 já iam em 80 cms. Contudo, a combinação de uma cultura cheia de revistas femininas e talk-shows para mulheres, com a expansão do acesso a cirurgias plásticas e a proliferação de ginásios levou a uma mudança enorme na forma como as mulheres lidam com os seus corpos e com os tecidos que os cobrem. Um estudo de 2009 mostra que as mulheres de 40 anos utilizam agora mini-saias com o tamanho médio de 35 centímetros. Mais uma das vantagens do progresso.

Agora, se ao menos os homens pudessem substituir ter de escolher entre um par de sapatos pelo decidir o tamanho da saia…


07
Set 11
publicado por Nuno Amado, às 09:50link do post | comentar | ver comentários (1)

Gosto muito de filmes onde se vê a primeira vez que um casal dá as mãos.


05
Set 11
publicado por Nuno Amado, às 14:47link do post | comentar

Há quem diga que já não há heróis. Muitas mulheres deixaram de esperar que um príncipe em cavalo branco as venha salvar. Os homens que pretendem discordar, muitas vezes perguntam: Mas salvar do quê? De uma vida monótona? Da crise financeira? De um pneu furado? Nos filmes é comum que as mulheres bonitas sejam sujeitas a perigos físicos, raptos, malfeitores com enormes facas. Na vida real, felizmente, são poucas as ocasiões em que as mulheres precisam de ser salvas. Mas, mesmo assim, nessas situações, seriam os “homens de hoje em dia”, que fazem grande parte do seu exercício físico na Playstation, para quem uma barata é um animal selvagem e que consideram um acto intrépido tentar estacionar no Bairro Alto em Lisboa, capazes de fazer o que é correcto? Se existissem mesmo dragões haveria algum homem disposto a enfrentá-los? James Van Iveren, responderia que sim, que ele tinha dentro de si a coragem e a convicção suficientes para o tornar num príncipe encantado capaz de derrotar os malfeitores e salvar as donzelas em perigo. Mas antes de contar a peculiar sucessão de eventos do dia fatídico em que o nome de James Van Iveren saltou para os jornais, convém lembrar Dom Quixote.

 

A imortal personagem criada por Cervantes era um fidalgo envelhecido que acreditava ter em si a fibra e a alma de um herói. Tendo lido livros a mais, Dom Quixote partiu à procura de aventura acompanhado de Sancho Pança, uma figura bem mais nutrida e realista. A ânsia por aventura era tão forte para Quixote que acabou investindo com a sua lança contra moinhos de vento que julgava serem poderosos gigantes.

 

Ora, Van Iversen mais não é do que o Quixote moderno, mas a sua aventura teve um fim bem menos literário que a do cavaleiro espanhol: o tribunal. Num subúrbio de Milwaukee, com o impronunciável nome de Oconomowoc, vivia o nosso herói, então com 39 anos, na companhia da sua mãe. Na manhã onde tudo se passou, James estava em casa a ouvir música quando o ruído de uma donzela em perigo lhe chegou aos ouvidos sensíveis. A voz perturbada vinha do apartamento acima. Os sons eram claros e pareciam indicar que uma mulher estava a ser violada. Durante algum tempo ele procurou ignorar esses sons, tentando provavelmente convencer-se de que algo tão horrível não podia estar a ocorrer tão perto dele, apenas do outro lado do tecto. Mas os ruídos não acabaram, e a voz da mulher continuava a fazer-se ouvir, os gritos e gemidos assustadores ressoando pela casa. James achou que não podia ficar mais tempo quieto. Havia mesmo uma mulher a ser violada e ele não podia permitir que tal continuasse. Chamar a polícia estava fora de hipótese já que ele não tinha telefone mas, quis o destino que James tivesse herdado uma antiga espada de cavalaria. O nosso herói desembainhou-a e, armado para o que desse e viesse, subiu escadas acima com a determinação de Dom Quixote cavalgando de encontro aos moinhos.

 

Algum tempo antes, Bret Stieghorst, um estudante de uma Universidade local e vizinho de cima de James Van Iveren, decidira ver um DVD pornográfico em espanhol sobre uma prática sexual específica. Ele escolhera este DVD apesar de não perceber a língua porque as actrizes eram sensuais, embora não tenha sido exactamente este o termo que ele usou para as classificar. Os gritos de ajuda que o vizinho de baixo pensara ouvir mais não eram que os gritos de suposto prazer que o vizinho de cima vira na televisão. Qual a surpresa de Bret quando James Van Iveren, com um pontapé, rebenta a fechadura da porta e lhe entra pela casa a dentro, espada em punho, berrando “Onde está ela? Onde está ela?”. Tal como Quixote não se deixou convencer por Sancho Pança de que eram Moinhos os seus opositores e não gigantes, também James precisou que Bret o levasse de divisão em divisão abrindo armários e portas para que o primeiro acreditasse que ali não estava mulher nenhuma.

James foi acusado de três crimes diferentes, alguns deles graves, já que se encontrava na posse de uma arma. O seu comentário a todo o evento foi que se sentia estúpido e que havia tudo sido um erro. Quanto ao vizinho, além de provavelmente passar a ver a pornografia com o som mais baixo, reconheceu o heroísmo de James, mas não abdicou do seu direito de ser recompensado pela porta destruída.

 

James acabou por pagar 141 dólares pela porta, mas evitou ir para a prisão. Teve também direito a acompanhamento psiquiátrico. Dom Quixote nunca teve tal sorte.


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